Nos 20 anos da elevação de Sintra a Património Mundial o Grupo Político Municipal do Bloco de Esquerda solicitou à escritora Filomena Marona Beja, e estimada amiga, um texto evocativo da efeméride.
Texto publiacado originalmente na página da Assembleia Municipal de Sintra.
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PATRIMÓNIO
Que má cousa são vilãos
e a gente popular,
que não sabem desejar
senão huns desejos vãos,
que não são terra nem mar.
De nenhum bem dizem bem,
nem o sabem conhecer.
Quem o dizia era a Serra de Sintra, pela boca de Paula. Paula Vicente.
As palavras eram de seu pai. De Mestre Gil, o que fazia autos a El-Rei, quando tinha com quê.
E o auto era “O TRIUNFO DO INVERNO”, representado em Lisboa, no ano de 1529.
O tempo passou.
A Corte vinha para Sintra, se fazia calor em Lisboa. Se Havia peste.
William Beckford, alugou a Quinta da Bela Vista, no século XVIII. Depois, D. Fernando de Saxe-Coburgo-Gota subiu à Pena. E veio Lord Byron, trazendo o romantismo no seu estojo de escrita.
E o comboio!
Estavam cá os Saloios. Sempre estiveram.
Com tudo isto, não haveria a UNESCO de classificar Sintra como “PATRIMÓNIO DA HUMANIDADE”?
Classificou: a 6 de Dezembro de 1995.
Uma grande honra! Não se pense que não foi.
Mas...
E o que não aconteceu, desde então?
Os PDM’s que nunca evitaram as agressões ao ambiente nem à cultura tradicional? Os subúrbios que continuaram subúrbios?
E os pobres? Os mal alojados? Os mal transportados? Será que não eram dos contemplados quando, há 20 anos, se invocou, pronunciou, a palavra “PATRIMÓNIO”?
Talvez. Breve, porém, deixaram de o ser.
Já agora, volte-se a Mestre Gil.
Como remata ele o auto do “TRIUNFO DO INVERNO”? Alguém se lembra?
“Os Sintrões em folia se vam, que he a fim da susodia Tragicomédia.
Cantam: Vento bueno nos há de levar,
Garrido he o vendaval... “
Repare-se no que fica para trás, pelo chão: papéis de maços de queijadas, ossos dos leitões assados em Negrais, publicidade a tuck-tuck’s, ofertas imobiliárias. E à mistura, bocados de bilhetes de entrada nos Palácios e Parques. Milhares de bocados, esperando-se que no próximo Verão, ainda venham a ser mais.
Laus Deo!
Filomena Marona Beja